União Européia: o sonho da indústria de lácteos pode se tornar um pesadelo?

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Na mudança mais significativa na política agrícola da União Europeia (UE) em uma geração, as cotas de produção de leite – que foram colocadas em prática em 1984 – foram removidas na semana passada. Esse é um desenvolvimento que traz muitas oportunidades para a região, mas também desafios.

Inicialmente, a remoção das cotas permite que os produtores de leite europeus compitam com igualdade de condições com seus pares globais.

Quando foram introduzidas, as cotas foram muito necessárias devido ao excesso de oferta estrutural no mercado europeu. Os anos setenta e oitenta viram um enorme excedente de produtos lácteos na UE, porque os produtores tiveram garantido um preço definido para seu produto. Antes das cotas serem impostas, a Europa estava se afogando nos chamados “lagos de leite” e “montanhas de manteiga”, com o excesso de produtos ou sendo armazenados – a um enorme custo – ou sendo colocados no mercado mundial, levando a uma baixa nos preços.

A introdução das cotas resolveu o problema do excesso de oferta, mas veio com um custo. À medida que a demanda por lácteos aumentava rapidamente no mundo, os produtores e processadores de leite da Europa ficaram para trás na concorrência com países como a Nova Zelândia. A partir do começo desse mês, no entanto, não há mais esse problema, mas essa liberação significa que a indústria de lácteos da Europa estará à mercê das forças do mercado (apesar de alguns mecanismos de suporte ainda deverem continuar em funcionamento).

O medo agora é que os produtores de leite e processadores de lácteos encham o mercado com produtos, direcionando o preço do leite para baixo. De fato, as nações produtoras de lácteos vêm aumentando a produção nos últimos anos e tudo indica que a pressão se manterá.

Mesmo com as cotas em funcionamento até a semana passada, as exportações de lácteos da UE aumentaram em 45% em volume e em 95% em valor nos últimos cinco anos, de acordo com a Comissão Europeia. Atualmente, trata-se de uma indústria de €55 bilhões (US$ 59,57 bilhões), responsável por 15% da produção agrícola total da UE, com a Alemanha sendo o maior produtor da região, produzindo 32 milhões de toneladas em 2014. Holanda, Dinamarca, Polônia e Irlanda também são nações fortes na produção de leite na região e todas planejam aumentar a produção nos próximos anos.

Alemanha e Holanda estão querendo aumentar em até 20% a produção até 2020, enquanto a Irlanda é mais ambiciosa, com planos de aumentar a produção de leite em 50% no mesmo período.

Isso a tornaria a nação de mais rápido crescimento na produção de leite do mundo e a Irlanda está investindo pesadamente para alcançar essa meta. Um dos maiores processadores do país, a Glanbia, acabou de abrir uma nova planta de € 185 milhões (US$200,39 milhões) para produzir leite em pó para exportação. A Glanbia diz que seus fornecedores de leite esperam aumentar a produção em 63% nos próximos cinco anos.

Para a UE como um todo, a produção de leite já aumentou em 12 milhões de toneladas desde 2008 e deverá aumentar em mais 12 milhões de toneladas até 2024, trazendo o total para 170 milhões de toneladas. Durante o mesmo período, a produção nos Estados Unidos deverá aumentar em 10 milhões de toneladas e na Oceania em cinco milhões de toneladas.

Para onde irá todo esse leite extra? É claro, todos os olhos estão se voltando para a China e seu crescente gosto por produtos lácteos de alta qualidade. A Europa, assim como a Austrália, está esperando aumentar de forma significativa as exportações à China, mas a realidade da demanda chinesa e da oferta global não justificam tamanho otimismo.

De acordo com a Comissão Europeia, “a China deverá manter sua posição como maior importador mundial de commodities lácteas” até 2024, mas, conforme mostrado no gráfico abaixo, o aumento anual nas importações chinesas desacelerarão para 3% ao ano na próxima década, bem menos que os 16% ao ano vistos nos últimos 10 anos. Com a China devendo se tornar mais autossuficiente e tornando sua indústria de lácteos mais custo-competitiva, um aumento mais rápido do que o esperado nos níveis de produção doméstica poderá ter um importante impacto nos preços e na demanda.

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A Austrália já está sofrendo com a demanda moderada da China, com o The Australian reportando na semana passada que as exportações de lácteos ao país caíram em 25% com relação ao ano anterior. Ao mesmo tempo, a Europa está entrando com tudo na Ásia. As exportações de lácteos da UE à Coreia mais que dobraram, de € 99 milhões (US$ 107,23 milhões) para € 235 milhões (US$ 254,55 milhões) entre 2010 e 2014. Ao mesmo tempo, as companhias de lácteos na França, na Dinamarca e na Holanda se associaram com companhias chinesas em acordos multimilionários para fornecer leite em pó e fórmulas para bebês ao país à medida que suas próprias indústria de lácteos lidam com o excesso de capacidade que tem forçado os produtores a descartar leite fresco.

A maior produção e a demanda mais moderada significam que os produtores do mundo estão sendo afetados pela queda dos preços do leite. Os preços do leite na Europa já estão abaixo do nível de breakeven (equilíbrio, sem perdas nem lucros) na maioria dos Estados Membros e não há sinais de que aumentarão em breve. No entanto, apesar da pressão nos preços, a região não tem planos para desacelerar os programas de expansão da produção.

Um Acordo de Livre Comércio com a China fornece uma oportunidade para a Austrália e a esperança é que essa possa se mirar no sucesso da Nova Zelândia na China. Infelizmente, o país não está em um momento tão bom quanto a Nova Zelândia estava em 2008, quando a demanda por produtos lácteos premium estava aumentando.

Alguns analistas do setor agrícola estão dizendo que a remoção das cotas de produção de leite da UE não terá um grande impacto em curto prazo e que, em um prazo mais longo, as nações agirão racionalmente, equilibrando a oferta com a demanda. De uma perspectiva racional, isso faz sentido. Porém, assim como vemos nos mercados de minério e petróleo, a racionalidade nem sempre vence quando se fala de leis da oferta e da demanda.

A reportagem é do Business Spectator.

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Fonte da reportagem: http://www.milkpoint.com.br/cadeia-do-leite/giro-lacteo/ue-o-sonho-da-industria-de-lacteos-pode-se-tornar-um-pesadelo-94300n.aspx
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